BE08: Intrusão operacional

As operações não invadem ecossistemas nem comunidades

1. Ambição

Uma empresa Future-Fit preserva a integridade de todas as áreas com elevado valor biológico, ecológico, social ou cultural — tanto protegendo essas áreas onde já opera, como evitando expandir-se para novas áreas sempre que exista risco de degradação.79

1.1 O que significa este objetivo

A crescente procura por terra está a exercer pressão sobre ecossistemas, comunidades e espécies vegetais e animais. As empresas que não consideram adequadamente os impactos da sua presença física podem provocar uma degradação irreversível dos processos naturais e dos recursos dos quais dependem — elas próprias e outros — e podem comprometer o bem-estar das comunidades locais.

O objetivo deste compromisso é eliminar os impactos negativos das atividades empresariais sobre os ecossistemas naturais e as comunidades. Isto inclui, entre outros aspetos:

  • Respeitar os direitos fundiários das comunidades (ex.: tolerância zero à apropriação de terras).
  • Proteger os ecossistemas aquáticos da degradação (ex.: evitando recifes de coral).
  • Proteger áreas com elevado valor de biodiversidade (ex.: não converter floresta tropical em terrenos agrícolas).
  • Evitar invadir áreas de importância cultural (ex.: não instalar oleodutos em territórios considerados sagrados por Povos Indígenas).

Para ser Future-Fit, a empresa deve: (a) proteger essas áreas onde já está presente e (b) adotar medidas para evitar ou mitigar impactos negativos ao expandir-se para novas zonas.

1.2 Porque é que este objetivo é necessário

Tal como todos os Objetivos de Limite Mínimo Future-Fit, este objetivo é essencial para garantir que a empresa não está a comprometer o progresso da sociedade rumo a um futuro ambientalmente restaurativo, socialmente justo e economicamente inclusivo. Para saber mais sobre a base científica destes objetivos — fundamentada em mais de 30 anos de ciência sistémica — consulte o Guia de Metodologia.

As estatísticas seguintes ajudam a ilustrar por que razão é crítico que todas as empresas alcancem este objetivo:

  • A desflorestação, muitas vezes provocada intencionalmente para converter terrenos para uso comercial, é uma das principais causas das alterações climáticas e da perda de biodiversidade. Estimam-se perdas anuais de 46 a 58 mil milhas quadradas de floresta — o equivalente a 48 campos de futebol por minuto. [85]
  • Não é apenas a terra que importa proteger. A nível global, cerca de 275 milhões de pessoas vivem a menos de 30 km de um recife de coral e dependem de cadeias alimentares complexas que começam nas fendas desses recifes. Embora os recifes representem apenas 0,2% da superfície marinha, fornecem alimento e abrigo a cerca de um terço das espécies marinhas. [86]

1.3 Como este objetivo contribui para os ODS

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas constituem uma resposta coletiva aos maiores desafios sistémicos do mundo, pelo que estão naturalmente interligados. Qualquer ação pode ter um impacto direto sobre alguns ODS e, indiretamente, sobre outros, através de efeitos de arrastamento. Uma empresa Future-Fit pode ter a certeza de que está a contribuir - e de forma nenhuma a prejudicar - o progresso em direção aos ODS.

As empresas podem contribuir para vários Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) ao garantir que as suas operações não invadem ecossistemas nem comunidades, e ao incentivar ativamente os seus fornecedores a fazer o mesmo. No entanto, as ligações mais diretas relativamente a este objetivo são:

         Ligação a este Objetivo de Limite Mínimo
SDG 1 Apoiar esforços para garantir que todas as pessoas tenham direitos iguais aos recursos económicos e naturais, bem como à posse e/ou controlo da terra e de outros bens.
SDG 6 Apoiar esforços para proteger os ecossistemas aquáticos.
SDG 11 Apoiar esforços para promover uma urbanização inclusiva e sustentável, reforçar a proteção e salvaguarda do património cultural e natural mundial, e reduzir o impacto ambiental per capita das cidades.
SDG 13 Apoiar esforços para reforçar a resiliência e a capacidade de adaptação face a perigos climáticos e catástrofes naturais em todos os países.
SDG 14 Apoiar esforços para gerir e proteger de forma sustentável os ecossistemas marinhos e costeiros, evitando impactos adversos significativos através do reforço da sua resiliência.
SDG 15 Apoiar esforços para assegurar a conservação e utilização sustentável dos ecossistemas terrestres e das águas doces interiores, travar a desflorestação e combater a desertificação, garantir a conservação dos ecossistemas de montanha, reduzir a degradação dos habitats naturais, travar a perda de biodiversidade e proteger e evitar a extinção de espécies ameaçadas.

2. Ação

2.1 Por onde começar

Contextualização

As empresas devem estar conscientes das formas como as suas operações podem afetar o meio físico envolvente. Edifícios, uso do solo e outros aspetos da atividade empresarial podem interferir, de forma inesperada, com comunidades locais e ecossistemas. Os governos e outros proprietários de terras nem sempre consideraram, de forma consistente, o valor cultural ou natural de determinados locais ao conceder ou vender terrenos, o que pode ter levado a que as empresas não dispusessem dos dados necessários para considerar estas questões nos seus planos operacionais e nos seus investimentos em infraestruturas.

As empresas devem, por isso, estabelecer uma base de conhecimento sólida sobre as comunidades e as áreas naturais que afetam. Os primeiros passos rumo à sustentabilidade Future-Fit passam por analisar os mecanismos de controlo que têm implementados para gerir o impacto sobre o meio físico, identificar preocupações comuns enfrentadas pelo seu setor de atividade (incluindo aquelas que são específicas de determinadas regiões) no que diz respeito à presença física, e compreender as preocupações locais em cada localização. A partir daí, podem planear os próximos passos e explorar oportunidades de melhoria.

Perguntas a colocar

As seguintes perguntas ajudam a identificar as informações a recolher.

Em que áreas a empresa tem presença física?
  • Onde estão localizadas as suas instalações e outros ativos fixos? Quantas instalações possui? Que tipo de atividades decorrem em cada uma dessas localizações?
  • A empresa gere e/ou extrai recursos naturais em áreas significativas80 ou nas suas proximidades?
  • O que se sabe sobre as áreas envolventes de cada uma das localizações da empresa? Existem locais situados em ou perto de áreas protegidas, ecossistemas pristinos ou habitats naturais em perigo?
  • Existem controlos internos para limitar o impacto que as operações da empresa têm sobre o meio envolvente?
  • Qual é a abordagem adotada quando a empresa pretende expandir instalações existentes ou estabelecer-se numa nova localização? De que forma são tidas em conta as comunidades e os contextos naturais? Esta questão é tratada apenas como uma obrigação legal ou a empresa tem metas mais ambiciosas?
  • A empresa necessita de autorização para operar em algumas localizações (ex.: por parte de autoridades locais ou comunidades)? Em caso afirmativo, qual é o processo para obter essa autorização?
De que forma a presença da empresa influencia o ambiente e as comunidades locais?
  • Em cada localização, que tipos de perturbação física são causados pelas operações da empresa? Que medidas são tomadas para reduzir ou mitigar essas perturbações?
  • De que principais recursos (inputs) depende a empresa para operar em cada localização — como água, energia ou produtos químicos? A utilização desses recursos é suscetível de gerar preocupações por parte das comunidades ou ecossistemas (ex.: escorrência de fertilizantes que prejudica a vida aquática)?
  • A empresa está sujeita a alguma regulamentação ambiental relacionada com as suas operações físicas? Como varia esta regulamentação entre localizações?
  • Algumas organizações, instituições de investigação ou autoridades já levantaram preocupações em relação a práticas comuns no setor? Em caso afirmativo, a empresa tomou medidas para lhes dar resposta?
  • Existem organizações locais que destacam ativamente problemas associados à presença física ou às práticas da empresa? Em caso afirmativo, a empresa estabeleceu contacto ou realizou consultas com essas entidades sobre as suas atividades passadas, atuais ou futuras?
Como definir prioridades

As seguintes perguntas ajudam a identificar e a priorizar ações de melhoria.

Quais são as melhores oportunidades para a empresa progredir?
  • A empresa já identificou áreas com elevado valor ecológico, social ou cultural que possam ser afetadas pela sua presença física? Em que localizações é mais disruptiva essa presença?
  • Em que localizações existe maior potencial de risco reputacional, caso não haja melhorias nas práticas de gestão?
  • Existem oportunidades para colaborar com grupos locais ou com outras empresas na abordagem de desafios comuns?
A empresa tem metas estabelecidas para reduzir os impactos negativos da sua presença física?
  • Se existem compromissos, são suficientes para reduzir de forma significativa os impactos negativos e alcançar a sustentabilidade Future-Fit ao longo do tempo? Se forem insuficientes, como podem ser ajustados ou complementados?
  • Se atualmente não existirem metas, como pode a empresa abordar a definição de metas novas ou adicionais? De quem seria necessária autorização? Que pessoas e recursos seriam necessários para conceber e implementar os mecanismos de controlo que assegurem o cumprimento dessas metas?
Poderá a empresa ir além do exigido por este objetivo?
  • Para além do necessário para atingir este objetivo, existem ações que a empresa possa realizar para garantir que a nossa presença física protege a saúde dos ecossistemas e comunidades?81 Qualquer ação nesse sentido pode acelerar o progresso da sociedade rumo à sustentabilidade Future-Fit. Para mais detalhes, consultar o Guia de Ações Positivas.

A próxima secção descreve os critérios de avaliação necessários para determinar se uma ação específica resultará em progressos rumo à sustentabilidade Future-Fit.

2.2 Prosseguir rumo à sustentabilidade Future-Fit

Introdução

A avaliação da sustentabilidade Future-Fit deve ser feita local a local. Ou seja, todas as instalações e ativos fixos detidos ou controlados pela empresa devem ser avaliados com base nos critérios de avaliação.82

Aplicabilidade das rotas de transporte

Embora as rotas de transporte e os ativos móveis possam também causar vários efeitos negativos em ecossistemas ou comunidades, considera-se que estão fora do âmbito deste objetivo, pelas seguintes razões:

  • As rotas de transporte (estradas, corredores marítimos, rotas aéreas comerciais) são geralmente determinadas por entidades governamentais e não estão sob controlo direto da empresa.
  • Embora as perturbações causadas por ruído e vibrações possam ser disruptivas para comunidades ou ecossistemas, não existe um consenso claro sobre como medir eficazmente esse impacto.

Importa, no entanto, referir que as estradas de serviço devem ser incluídas na avaliação sempre que: sejam construídas ou contratadas pela empresa; e/ou a sua única ou principal finalidade seja dar apoio às atividades operacionais da empresa.

Uma vez avaliada a sustentabilidade Future-Fit de todos os locais, é então possível calcular o progresso da empresa rumo à sustentabilidade Future-Fit. Este passo está descrito em detalhe na secção Avaliação.

Orientações para identificar áreas com elevado valor biológico, ecológico, social ou cultural

A empresa deve identificar de que forma as suas operações interagem fisicamente com ecossistemas ou comunidades. Os locais atuais e futuros devem ser avaliados de acordo com os seguintes requisitos:

  • Recolher informação sobre as principais características sociais e ecológicas da paisagem envolvente. O HCV Resource Network disponibiliza orientações úteis. A avaliação não deve incidir exclusivamente sobre a localização do local em si, mas deve alargar-se ao contexto da paisagem mais vasta, incluindo as atividades desenvolvidas em zonas vizinhas, o uso do solo na região, áreas próximas classificadas como protegidas e corpos de água a jusante. [49] Ver Recursos adicionais para identificação de locais significativos para uma lista de outras fontes úteis.
  • Se alguma componente das operações da empresa estiver perto de uma área importante, determinar se essa presença já causou impactos ou se é provável que venha a causar no futuro.
Orientações para eliminar impactos negativos em áreas com elevado valor biológico, ecológico, social ou cultural

Se a análise referida anteriormente concluir que a presença da empresa afetou, está a afetar, ou é suscetível de afetar uma área com elevado valor biológico, ecológico, social ou cultural, a empresa deve atuar de acordo com a seguinte hierarquia de mitigação: [87]

  • Evitar impactos inaceitáveis;
  • Minimizar os impactos;
  • Restaurar as áreas afetadas.

Exemplos de abordagens para mitigar impactos negativos incluem:

  • Implementar um compromisso formal de não operar em áreas com este tipo de valor.
  • Envolver as comunidades locais ou partes interessadas especializadas para definir formas de mitigar os impactos.
  • Recorrer a orientações de especialistas no tema, como a HCV Resource Network para gerir e monitorizar locais significativos.
Critérios de avaliação - Fitness criteria

Para ser Future-Fit, a empresa deve cumprir os seguintes critérios em todas as instalações e ativos fixos que detenha ou controle.

Avaliação de todos os locais onde a empresa tem presença operacional física
Proteção das comunidades e ecossistemas identificados
  • As características, funções, a diversidade e o estado de preservação de cada área com elevado valor ecológico, social ou cultural devem ser protegidos contra impactos negativos resultantes da presença da empresa.
  • Se a empresa operar numa área com histórico de apropriação indevida de terras (land grabbing), deve verificar que o seu local de operação não foi sujeito a essa prática. Isto significa que:
    • O direito de propriedade ou de exploração do terreno não é contestado por comunidades locais que tenham reivindicações documentadas, ou cujo uso da terra tenha precedentes históricos;
    • As atividades em terrenos utilizados por comunidades, ou adjacentes a essas comunidades, estão sujeitas ao consentimento livre, prévio e informado dessas mesmas comunidades.
Restauro de danos passados
  • A empresa é obrigada a restaurar qualquer área significativa anteriormente afetada pelo desenvolvimento de um local por parte de terceiros, caso venha a assumir o controlo desse local (ex.: se uma empresa tiver desmatado floresta primária para criar uma plantação de óleo de palma, e esse ativo for posteriormente adquirido). Interromper a degradação não é suficiente: a empresa deve tomar todas as medidas possíveis para neutralizar os impactos anteriores do local (ex.: através de reflorestação).84

  • A empresa não é obrigada a restaurar áreas significativas degradadas por fatores fora do seu controlo e das quais não retira qualquer benefício. Isto inclui áreas afetadas por desastres naturais, alterações climáticas e ações de terceiros com os quais a empresa não mantém – nem nunca manteve – qualquer relação comercial (ex.: projetos de infraestrutura pública, povoamentos indígenas).

3. Avaliação

3.1 Indicadores de progresso

O objetivo dos indicadores de progresso Future-Fit é refletir o grau de evolução de uma empresa no cumprimento de um determinado objetivo. Estes indicadores são expressos em percentagens simples.

Deve procurar-se avaliar a sustentabilidade Future-Fit da empresa em toda a extensão das suas atividades. Em algumas situações, tal pode não ser possível. Nestes casos, deve ser consultada a secção Avaliação e reporte com dados incompletos no Guia de Implementação.

Avaliação do progresso

Este objetivo tem um único indicador de progresso. Para o calcular, devem ser seguidos os seguintes passos:

  • Avaliar os critérios de avaliação de cada local detido ou controlado pela empresa;
  • Calcular o progresso em todos os locais.
Avaliação do cumprimento dos critérios num local

Um local é considerado 100% conforme com este objetivo se cumprir todos os critérios de avaliação; caso contrário é considerado 0%.

Cálculo do progresso da empresa

Quando todos os locais forem identificados e avaliados, o progresso pode ser calculado da seguinte forma:

  • Somar a área de cada local que cumpre os critérios de avaliação definidos;
  • Somar a área total de todos os locais detidos ou controlados pela empresa.

Isto pode ser expresso matematicamente da seguinte forma:

\[F=\frac{A_F}{A_T}\]

Onde:

\[F\] É o progresso rumo à sustentabilidade Future-Fit, expresso em percentagem.
\[A_F\] É a área total detida ou controlada pela empresa que cumpre os critérios de avaliação.
\[A_T\] É a área total de terrenos detidos ou controlados pela empresa.

Para um exemplo de como calcular este indicador de progresso, ver aqui.

Nota sobre os limites da responsabilidade de uma empresa

Para este objetivo, a empresa deve avaliar as suas próprias operações (locais de trabalho e ativos físicos) que tenham impacto físico sobre o meio envolvente. Embora uma empresa não seja totalmente responsável por áreas ou atividades controladas por outras organizações, é previsível que algumas empresas possam tirar partido dessa divisão, externalizando atividades particularmente disruptivas para terceiros. A possibilidade de utilizar estruturas empresariais para desviar responsabilidades por danos ambientais ou sociais constitui uma fragilidade — também presente nas esferas da responsabilidade legal e financeira.

Ex.: empresas mineiras podem contratar uma organização especializada para desativar antigos locais de mineração. Esta é, em si, uma prática razoável. No entanto, do ponto de vista da ética empresarial, as empresas não devem procurar o orçamento mais baixo à custa da qualidade da desativação do local e da respetiva recuperação. Empresas responsáveis garantirão que quaisquer impactos negativos das suas atividades operacionais são devidamente tratados — seja através de contratos dependentes de desempenho, seja trabalhando com grupos locais para identificar e responder a preocupações relacionadas com o uso do solo e a sua restauração.

3.2 Indicadores de contexto

O objetivo dos indicadores de contexto é fornecer às partes interessadas as informações adicionais necessárias para interpretar de forma completa o progresso de uma empresa.

Área total detida ou controlada pela empresa

A empresa deve reportar a área total de terreno que detém ou controla (incluindo secções de corpos de água que sejam da sua responsabilidade). Importa referir que estes dados são necessários para o cálculo do indicador de progresso, pelo que não é necessário esforço adicional para os obter.

Para um exemplo de como reportar os indicadores de contexto, consultar aqui.

4. Verificação

4.1 Para que serve a verificação e porque é importante

Qualquer empresa que esteja a trilhar o caminho da sustentabilidade Future-Fit incutirá mais confiança entre as suas partes interessadas - desde a administração de topo (CEO, CFO) até a investidores externos - se conseguir demonstrar a qualidade dos seus dados e a robustez dos controlos que os sustentam.

Isto é particularmente importante se a empresa pretender comunicar publicamente o seu progresso rumo à sustentabilidade Future-Fit, uma vez que algumas organizações podem exigir uma verificação independente antes da divulgação pública. Ao implementar controlos eficazes e bem documentados, a empresa facilita a compreensão do seu funcionamento por parte de auditores ou avaliadores externos, apoiando a sua capacidade de prestar garantia e/ou recomendar melhorias.

4.2 Recomendações para este objetivo

Os pontos seguintes destacam áreas que merecem especial atenção relativamente a este objetivo específico. Cada empresa e cada período de reporte são únicos, pelo que os processos de verificação e garantia variam: em qualquer situação, os auditores podem procurar avaliar diferentes controlos e evidências documentadas. Por conseguinte, estas recomendações devem ser entendidas como exemplos ilustrativos do que poderá ser solicitado, e não como uma lista exaustiva do que será exigido.

  • Garantir que a empresa realizou avaliações para identificar todas as áreas de elevado valor de conservação que possam ser impactadas pelas suas atividades, e manter toda a documentação resultante dessas avaliações. Isto pode ajudar os auditores a avaliar se a abordagem da empresa corre o risco de omitir impactos relevantes;
  • Para todas as áreas de elevado valor de conservação identificadas, manter documentação de uma avaliação de referência que estabeleça as características, funções, a diversidade e o estado de preservação dessas áreas, de modo a facilitar comparações futuras e criar um registo documental. Esta avaliação de referência pode ajudar os auditores a validar afirmações relativas à conservação e à restauração.

Para uma explicação mais geral sobre como conceber e documentar controlos internos, consultar a secção Rumo à sustentabilidade Future-Fit de forma sistemática no Guia de Implementação.

5. Informação adicional

5.1 Exemplo

A ACME Inc. vende produtos de limonada. As suas operações consistem em dois locais: uma unidade de engarrafamento e um escritório. O escritório ocupa 1.500m2 está situado num edifício partilhado no centro de uma cidade, numa zona comercial estabelecida há muito tempo. A presença da empresa nesse local foi avaliada e concluiu-se que não tem qualquer impacto negativo sobre as comunidades ou ecossistemas locais.

A unidade de engarrafamento ocupa 10.000m2. Está localizada numa área de elevada biodiversidade e foi construída numa parcela de terreno anteriormente não urbanizada. A empresa realiza uma avaliação para compreender de que forma as suas atividades afetaram — e podem continuar a afetar — a biodiversidade local. Conclui que a área atualmente ocupada pela fábrica era habitat de várias espécies de aves canoras em perigo, cujas populações estão a ser afetadas pela perda de habitat. Determina-se que a construção da fábrica contribuiu para a redução da área disponível para essas espécies, o que constitui um impacto negativo no ecossistema. A empresa mede, assim, o seu desempenho da seguinte forma:

\[f_{Fábrica}=0\%, \:and\:\: f_{Escritório}=100\%\]

Assim:

\[F=\frac{A_F}{A_T}=\frac{1,500}{1,500+10,000}\approx13\%\]

A empresa inicia então um projeto em colaboração com a comunidade local para replantar espécies arbóreas nativas e instalar uma “cobertura verde” na fábrica, semeada com flora local da qual as espécies em perigo dependem. Especialistas independentes em biodiversidade são envolvidos para apoiar e monitorizar o regresso dessas espécies ameaçadas e, ao fim de cinco anos, conclui-se que o impacto negativo da empresa foi revertido.

A empresa pode agora calcular o seu progresso da seguinte forma:

\[F=\frac{A_F}{A_T}=\frac{11,500}{11,500}=100\%\]

Indicador de contexto

Área total detida ou controlada pela empresa: 11.500m2.

5.3 Perguntas frequentes

A presença de uma empresa não será sempre, de alguma forma, disruptiva?

Uma das ambições deste objetivo é que as empresas evitem expandir-se para novas áreas, sempre que exista risco de degradação. A palavra risco (ou possibilidade, conforme o original em inglês) é usada intencionalmente para transmitir que as práticas empresariais devem ser modificadas sempre que seja razoavelmente provável a ocorrência de impactos significativos — mesmo que esses impactos não sejam certos. Atividades que possam causar danos irreparáveis a áreas de elevado valor de conservação devem ser sempre evitadas.

A utilização de água como mecanismo de arrefecimento pode perturbar os ecossistemas?

O objetivo A utilização da água é ambientalmente responsável e socialmente equitativa inclui orientações sobre a temperatura das descargas de água, conforme definido pelos US EPA Quality Criteria for Water. [44] Estas orientações incluem resultados de investigação específicos sobre o impacto das alterações de temperatura em espécies aquáticas individuais, limites absolutos para a temperatura aceitável das descargas, e orientações específicas consoante o contexto sobre o impacto das descargas na temperatura instantânea e média semanal do corpo hídrico recetor.

O princípio base é que os ecossistemas aquáticos são sensíveis a variações de temperatura. Por isso, as empresas devem garantir que a água é descarregada à mesma temperatura — ou o mais próxima possível — da do corpo hídrico recetor, conforme definido nas orientações referidas.

Dado que a água é frequentemente utilizada como dissipador térmico em processos industriais, as empresas devem considerar o impacto potencial sobre os ecossistemas quando descarregam calor diretamente em corpos de água (de forma intencional ou acidental). Uma empresa que capte água para arrefecimento e depois a devolva à fonte original está a causar um efeito semelhante ao de colocar equipamentos operacionais diretamente num corpo de água vizinho para o arrefecer, mesmo sem captar ou descarregar fisicamente a água.

Neste sentido, o objetivo As operações não invadem ecossistemas nem comunidades sobrepõe-se ligeiramente ao objetivo Utilização da água, mas os mesmos limites quanto à perturbação dos ecossistemas devem ser aplicados em ambos os casos.

Bibliografia

[44]
“Quality criteria for water - 1986.” United States Environmental Protection Agency, 01-May-1986 [Online]. Available: https://nepis.epa.gov/Exe/ZyPDF.cgi/00001MGA.PDF?Dockey=00001MGA.PDF. [Accessed: 24-Nov-2017]
[49]
E. Brown, N. Dudley, A. Lindhe, D. R. Muhtaman, C. Stewart, and T. Synott, “Common guidance for the identification of high conservation values.” 2013 [Online]. Available: https://www.hcvnetwork.org/library/common-guidance-for-the-identification-of-hcv-english-indonesian-french-portuguese. [Accessed: 02-Dec-2023]
[85]
“Deforestation.” World Wildlife Fund, 2017 [Online]. Available: https://www.worldwildlife.org/threats/deforestation. [Accessed: 01-Dec-2017]
[86]
Koffman, Margaret, “Could public-private partnerships hold the key to protecting the world’s oceans?” 2017 [Online]. Available: https://descrier.co.uk/science/public-private-partnerships-hold-key-protecting-worlds-oceans/. [Accessed: 27-Oct-2017]
[87]
“Guidance note 6 biodiversity conservation and sustainable management of living natural resources.” International Finance Group, 2012 [Online]. Available: https://zeroextinction.org/wp-content/uploads/2018/05/Updated_GN6-2012.pdf. [Accessed: 13-Sep-2017]
[88]
“The HCS approach toolkit.” High Carbon Stock Approach, May-2017 [Online]. Available: http://highcarbonstock.org/wp-content/uploads/2017/05/HCSA-Toolkit-v2.0-Module-1-Introduction-190917-web.pdf. [Accessed: 03-Oct-2017]

  1. Para mais informações sobre o que se entende por possível degradação, ver esta pergunta frequente.↩︎

  2. Para efeitos deste objetivo, “áreas significativas” incluem ecossistemas raros ou complexos, ou áreas com elevado valor social ou cultural — incluindo áreas designadas como AVC (Alto Valor de Conservação) ou com características indicativas de um AVC. Ver HCV Network para mais informações.↩︎

  3. Esta é uma das oito Propriedades de uma Sociedade Future-Fit — para mais detalhes, ver o Guia de Metodologia.↩︎

  4. Algumas empresas podem ter dúvidas sobre se devem reportar potenciais impactos negativos neste objetivo ou no objetivo BE17: Os produtos não causam danos a pessoas nem ao ambiente (ex.: uma empresa imobiliária que constrói edifícios em terrenos não urbanizados que são posteriormente colocados à venda). Em caso de dúvida, ver a secção Diferenciação entre impactos operacionais e impactos relacionados com os produtos no Guia de Implementação.↩︎

  5. Algumas empresas procuram, deliberadamente, colaborar com comunidades locais adjacentes a ecossistemas pristinos, para promover a sua proteção — ex.: através de projetos de ecoturismo. Estas atividades, quando devidamente geridas, podem ser permitidas se uma entidade terceira, credível e independente, verificar que: (a) estão alinhadas com os interesses da comunidade e (b) não irão degradar os ecossistemas em causa.↩︎

  6. Se recuarmos suficientemente no tempo, todos os locais desenvolvidos foram, em algum momento, ecossistemas pristinos. O objetivo aqui é responsabilizar as empresas pela degradação recente de áreas convertidas para fins empresariais.↩︎